quarta-feira, 27 de outubro de 2021

China impacta o mundo ao anunciar sua ‘doutrina igualitária’ visando ‘prosperidade comum’

Partido Comunista muda suas prioridades sobre a sociedade e a economia e pode trazer consequências globais.


FONTE: GUIAME, COM INFORMAÇÕES DE REUTERS E BBC NEWS



China fortalecerá reformas tributárias para alcançar "prosperidade comum". (Foto: AFP)


Não é novidade que a China defende “uma sociedade menos desigual e com disparidades menores entre ricos e pobres” — esta é a definição chinesa para o que o mundo conhece como comunismo.

O assunto ganhou força na retórica de autoridades do país com um novo termo: prosperidade comum.

Porém, essa bandeira defendida pelo presidente Xi Jinping, nos últimos meses, tem chamado a atenção de especialistas de outras nações, já que “os planos da China têm o potencial de provocar enormes repercussões no resto do mundo”, de acordo com a BBC News.

Como funciona a “doutrina igualitária” da China

A China pretende "dividir o bolo" ajustando "razoavelmente" a renda dos mais ricos e elevando a renda dos grupos mais pobres, informou a agência estatal de notícias Xinhua.

“Mas a política tributária da China não deve ser mal interpretada como algo que rouba dos ricos para ajudar os pobres”, defendeu o artigo que disse representar “departamentos relevantes e pessoas autorizadas”.

Os críticos alertam que as medidas levam a um controle ainda maior do Estado sobre como o setor privado e a sociedade serão governados. Uma das mais visíveis consequências da “doutrina da prosperidade comum” tem sido um novo foco do setor privado chinês, com suas prioridades sendo direcionadas para o mercado doméstico.

Empresas que investem na China

A gigante de tecnologia Alibaba Group, cujo mercado global tem crescido nos últimos anos, comprometeu-se com 15,5 bilhões de dólares para a promoção de iniciativas de prosperidade comum na China.

Além disso, a Alibaba estabeleceu uma equipe dedicada a isso, liderada pelo executivo-chefe da empresa, Daniel Zhang. A empresa diz que se beneficiou do progresso econômico do país e que “se a sociedade está indo bem, e a economia está indo bem, então a Alibaba ficará bem”.

Sua concorrente Tencent, outra gigante da tecnologia, também está entrando nessa área. Prometeu 7,75 bilhões de dólares para a causa. O mundo corporativo chinês está disposto a mostrar que está contribuindo para o mandato do Partido Comunista nessa iniciativa.

‘Empresários se acostumam com a ideia’

Quando começou o movimento para que mais empresas apoiassem publicamente a nova visão do líder Xi Jinping, isso causou um "certo choque", disse privadamente à BBC um alto executivo de uma empresa chinesa.

A origem dessa disparidade de renda remete a reformas feitas há cerca de 40 anos, que abriram a economia de mercado chinesa e permitiram o acúmulo de vastas fortunas pessoais, informou a agência Reuters.

Ao mesmo tempo em que surgiam centenas de bilionários no país, crescia a desigualdade entre a China rural e a urbana. Se a prosperidade comum significa um foco maior na emergente classe média chinesa, isso pode significar um rápido avanço para empresas globais que sirvam esses consumidores.

“Podemos ver que o foco em jovens obtendo empregos é bom", disse Joerg Wuttke, presidente da Câmara de Comércio da União Europeia na China.

O luxo pode perder espaço

Entretanto, negócios ligados ao setor de luxo podem não se sair tão bem, alerta Wuttke ao explicar que o foco será o crescimento da classe média.

“Os gastos chineses representam cerca de 50% do consumo de luxo no mundo e, se a China decidir comprar menos relógios suíços, gravatas italianas e carros de luxo europeus, essa indústria sofrerá um baque”, apontou.

Steven Lynch, da Câmara Britânica de Comércio na China, também diz que a prosperidade comum não é garantia de que a classe média vai crescer da mesma forma que cresceu nos últimos 40 anos.

Lynch também faz um questionamento que interessa à comunidade global: “Se eles estão se voltando mais para dentro, então será que eles realmente precisam do resto do mundo?", provocou.

O ‘novo socialismo’

"O Partido está agora preocupado com os trabalhadores medianos — como motoristas de táxi, trabalhadores migrantes e rapazes que fazem serviços de entregas", diz Wan Huiyao, do Centro para China e Globalização, de Pequim.

"A China quer evitar a sociedade polarizada que alguns países ocidentais têm, o que temos visto levar à desglobalização e à nacionalização”, ele disse.

Mas observadores da China de longa data dizem que o Partido realmente quer transformar o socialismo — com características chinesas — para que seja um modelo alternativo para o resto do mundo, então a prosperidade comum não é o caminho.

"Isso é parte da guinada para a esquerda e parte da guinada na direção de cada vez mais controle que tem sido indicativa do governo de Xi Jinping", diz George Magnus, acadêmico associado do Centro da China da Universidade de Oxford.

A realidade é outra

"A pressão implícita é para cumprir com os objetivos do Partido. Haverá imposto sobre rendas altas e 'não razoáveis' e pressão sobre empresas privadas para que façam doações para os objetivos econômicos do Partido”, alertou Magno.

O acadêmico também explica que se trata de uma espécie de China Utópica, imposta de cima para baixo, que o Partido espera que se mostre um modelo viável para o mundo, como alternativa ao que o Ocidente tem a oferecer.

Mas ele vem com um detalhe: ainda mais controle e poder nas mãos do Partido. A China sempre foi um ambiente difícil para negócios estrangeiros operarem, e a prosperidade comum significa que a segunda maior economia do mundo ficou ainda mais difícil de navegar.

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