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Manhã de quarta-feira em Brasília. Um grupo de homens e
mulheres se dirige a uma sala para rezar. A cena é comum em milhares de igrejas
pelo Brasil, mas, neste caso, seus participantes são deputados – e o local é um
dos auditórios do Congresso Nacional. É o culto semanal dos membros da Frente
Parlamentar Evangélica (FPE), um grupo multipartidário que afirma reunir 92
deputados evangélicos. Seus membros são a principal vitrine da mistura de
política e religião no Brasil.
Se considerada como bloco homogêneo, a frente conta na
Câmara com mais membros que o PMDB, que tem 68 deputados. A bancada existe
desde 2003 e surgiu no início do governo Lula e, à época, afirmava reunir 58
deputados. Segundo o deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), um dos membros, a
formação foi uma reação “ao confronto ideológico do PT, que queria promover
valores ateístas de esquerda”.
“Eles buscaram um confronto, e nós respondemos com a defesa
dos valores cristãos”, diz à DW. Ele afirma que a bancada está otimista com um
eventual governo Michel Temer. “Esperamos que seja um governo com mais diálogo
e menos viés ideológico”.
Na atual legislatura da Câmara – iniciada em 2015 –, a
frente contou com incentivos de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), um membro da
Assembleia de Deus que comandou oficialmente a Casa até esta semana.
Seus membros se especializaram em combater projetos que
pretendem ampliar direitos de homossexuais, expandir o aborto e promover a
educação sexual nas escolas. “Esses grupos são uma articulação que pretende
retroceder avanços de modernização social no Brasil. Nesse sentido eles são
reacionários”, afirma Dawid Bartelt, diretor da Fundação Heinrich Böll no
Brasil.
Segundo a professora de psicologia Bruna Suruagy, da
Universidade Mackenzie, que fez uma pesquisa sobre o tema, diversos assessores
ligados à frente e a igrejas costumam pesquisar projetos que podem servir de
alvos para os deputados.
“Eles identificam que algo ligado ao aborto, por exemplo,
está tramitando em uma comissão. Aí acionam algum deputado evangélico que
esteja na comissão para combater o projeto. Eles se veem como soldados de um
exército”, afirma.
Ainda segundo Suruagy, a bancada agiu nos últimos anos mais
como uma articulação do “contra” para combater projetos progressistas, mas
recentemente resolveu abordar pautas mais propositivas.
No momento, dezenas de projetos de cunho conservador ligados
aos deputados da frente estão tramitando no Congresso. Segundo Cavalcante,
entre os projetos considerados prioritários estão a aprovação do “Estatuto da
Família”, o “Estatuto do Nascituro” e a PEC 99/2011. Os dois primeiros são
projetos que centram na defesa da chamada “família tradicional” e no combate ao
aborto, respectivamente.
Já a PEC 99/2011 deseja que uma série de igrejas sejam
incluídas na lista de entidades com prerrogativa de propor ações diretas de
inconstitucionalidade ao Supremo Tribunal Federal (STF). Hoje, isso só é
prerrogativa de partidos políticos, chefes do Executivo e Legislativo e da
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), entre outros.
No ano passado, a frente já articulou a aprovação do aumento
da isenção tributária para igrejas e permitiu a anistia de multas aplicadas
pela Receita contra igrejas – o valor passava de 300 milhões de reais.
A FPE é presidida pelo deputado João Campos (PRB-GO), autor
do projeto da “cura gay”, que surgiu em 2013 com o objetivo de autorizar
tratamentos para combater a homossexualidade. A proposta gerou revolta entre a
comunidade gay e psicólogos, e acabou arquivada.
Membros e processos
Vários membros da frente respondem processos na Justiça. Em
2012, um levantamento da Transparência Brasil mostrou que 57% dos 56 deputados
que compunham a frente à época estavam respondendo a processos. Na atual
bancada, três deputados aparecem entre os investigados pela Lava Jato: Eduardo
Cunha, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e Missionário José Olímpio (DEM-SP).
O deputado Cavalcante afirma que não há nada especial nisso,
e que as acusações de corrupção são instrumentalizadas contra a fé dos
deputados. “Ninguém destaca a religião de um deputado católico ou judeu quando
ele é acusado de algo”, afirma.
Alguns deputados são filiados a siglas com fortes ligações
com igrejas. O PSC, por exemplo, é ligado à Assembleia de Deus. O PRB, por sua
vez, é ligado à Igreja Universal, do bispo Edir Macedo e tem o senador Marcelo
Crivella (PRB-RJ) como seu representante mais conhecido.
"Eles tem um projeto político, algo extremamente
mundano. É um reflexo do profundo conservadorismo que existe na sociedade
brasileira. Na Alemanha existe algum tipo de choque, mas ele está mais no plano
simbólico, como a discussão sobre crucifixos em prédios públicos. No Brasil, as
igrejas tentam uma interferência clara na política e em um universo maior de
assuntos.”, afirma Dawid Bartelt.
Expansão pelo Brasil
O fenômeno de políticos que misturam religião e política não
está restrito ao Congresso: deputados evangélicos também formam blocos em
assembleias e câmaras municipais pelo país. A bancada da Assembleia Legislativa
de São Paulo surgiu ano passado e afirma reunir 12 dos 94 deputados da Casa.
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Nos estados, os projetos propostos seguem o tom conservador.
Em 2015, o deputado Fábio Silva (PMDB) propôs que o Rio de Janeiro adotasse uma
espécie de lei contra a blasfêmia, proibindo piadas contra qualquer religião.
No Paraná e no Rio Grande do Sul existem projetos para promover o ensino do
criacionismo nas salas de aula e proibir o ensino a “ideologia de gênero” na
educação sexual.
Já nas câmaras municipais, vereadores agem para beneficiar
templos. No município de Serra (ES) uma proposta aumentou em 2012 a tolerância
ao barulho provocado por cultos, subindo o limite de 30 para 85 decibéis. Em
Manaus, uma vereadora propôs autorizar que pastores possam pregar em terminais
de ônibus. Em Fortaleza, surgiu um projeto para conceder gratuidade no transporte
público pra missionários. Já em Curitiba, um vereador quer que todas as placas
inaugurais de obras do município tenham a frase “Deus seja louvado”.
Fonte: DW Worl Fonte: folhagospel.com
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