Por Marcio S. da Rocha.
“Porquanto, para mim, o viver é Cristo, e o morrer é
lucro. Entretanto se o viver na carne traz fruto para o meu trabalho, já não
sei o que hei de escolher. Ora, de um e outro lado, estou constrangido, tendo o
desejo de partir e estar com Cristo, o que é incomparavelmente melhor.” (Fil.
1.21-23)
A experiência da morte é uma realidade para todos. Os
cristãos, mesmo depois de terem sido justificados pela graça de Deus, quando
receberam o Senhor Jesus pela fé, e assim terem garantida a sua salvação, não
são poupados da morte física, consequência do pecado original. Os filhos de
Deus por adoção (os crentes) certamente passam pela morte, muito embora os que
estiverem vivos quando o Senhor Jesus voltar fisicamente a Terra não
morrerão, mas serão transformados (1 Cor. 15.51-52). Apenas dois homens na
história humana foram poupados da morte, tendo sido transformados em corpos
glorificados e elevados (arrebatados) ao céu; e isto aconteceu antes mesmo da
primeira vinda de Cristo. Esses foram Enoque (Gen. 5.24) e o profeta Elias (2
Rs. 2.11). Podemos entendê-los como exceções à regra, casos especiais.
Nós, os demais, assim como os filhos de Deus que já se foram
desde o começo da história, inclusive os primeiros apóstolos e os mártires,
iremos com certeza morrer e ressuscitar, “em carne e osso” no dia do retorno do
nosso Senhor. Mas, o que acontece com nossa alma, depois da morte, no período
entre a morte até a ressurreição?
Quando o cristão morre, sua alma fica num estado de
sonolência ou vai direto para Deus e fica consciente?
A morte é a interrupção temporária da vida no corpo e a
separação da alma do corpo. Quando o cristão morre, embora o corpo permaneça na
terra e seja sepultado, no momento da morte, a alma (ou espírito) vai
imediatamente para a presença de Deus, consciente e cheia de alegria.
Quando o apóstolo Paulo pensava em sua morte, ele afirmou: “Preferindo deixar o
corpo, e habitar com o Senhor” (2 Co 5.8). Deixar o corpo é estar com o Senhor
Jesus. Ele também diz que o seu desejo é “partir e estar com Cristo” (Fp.
1.23). Jesus também disse ao ladrão que estava morrendo ao lado dele na cruz:
“Hoje estarás comigo no paraíso[1]”
(Lc 23.46). “Estarás comigo” indica que, desde aquele dia, aquele bandido que
se arrependeu e reconheceu que Jesus é o Filho de Deus está com Jesus,
consciente, gozando de sua presença. Outro texto bíblico que indica
fortemente o estado de consciência depois da morte e antes da ressurreição é
Apocalipse 6.9-11. Ali está uma referência clara a mártires que foram
assassinados e que JÁ DESFRUTAM da bênção de estar na presença gloriosa de
Deus, conscientes, antes da ressurreição de seus corpos.
A Bíblia não ensina a doutrina do “sono da alma”. O
fato de que a alma dos cristãos vai imediatamente para a presença de Deus
também significa que a doutrina do sono da alma é um erro. Essa doutrina ensina
que quando os cristãos morrem, eles entram em um estado de existência
inconsciente e que voltarão à consciência somente quando Cristo voltar e
ressuscitá-los para a vida eterna. Essa doutrina tem sido ensinada
eventualmente por alguns na história da igreja, inclusive alguns anabatistas da
época da Reforma e alguns seguidores de Edward Irving na Inglaterra no século
XIX. Um dos primeiros escritos de João Calvino foi um folheto contra tal
doutrina, a qual nunca teve ampla aceitação na igreja. Hoje em dia, os
Adventistas do Sétimo Dia são praticamente os únicos a adotarem esta doutrina.
O certo é que quando Cristo ou Paulo dizia que um morto “dormia” (I
Tess.) estava usando uma metáfora, uma figura de linguagem, referindo-se ao
corpo morto, que irá ressuscitar e, portanto, quando morto, fica por algum
tempo como se estivesse dormindo.
A Bíblia também não ensina a existência de um purgatório.
O fato de que a alma do cristão vai imediatamente para a presença de Deus nos
leva indubitavelmente a concluir que não existe algo como o purgatório. Na
doutrina católica romana, o purgatório é o lugar onde a alma do cristão é
purificada do pecado até que esteja pronta para ser aceita no céu. De acordo
com esse pensamento, os sofrimentos do purgatório são dados a Deus como
substitutos do castigo pelos pecados que os cristãos mereciam ter recebido, e
não receberam. Não consta em nenhum dos evangelhos bíblicos que Jesus tenha
ensinado que no mundo espiritual há um lugar em que as almas dos cristãos ficam
sendo punidas, para depois irem para a presença de Deus. Ao contrário, quando
contou a estória conhecida como parábola do Rico e Lázaro (Lucas 16.19-31),
Jesus afirma que ambos morreram e que Lázaro foi imediatamente para “O seio de
Abraão” (símbolo da presença de Deus). Lázaro estava consciente, gozando da
presença de Deus e não passou por nenhum “purgatório”. Não recebeu punição
alguma depois de morrer e antes de ir para a presença de Deus. Não precisava
mais de orações por parte dos vivos, porque já estava com Deus. Paulo, o
apóstolo, em nenhuma de suas cartas constantes no Novo Testamento, ensina ou
sequer menciona tal purgatório. Mesmo reconhecendo-se “o maior dos pecadores”
(1 Tim. 1.15) sabia e escreveu, por inspiração divina que, logo ao partir desta
vida, estaria com Cristo (Fil. 1.23); não passaria por nenhum “purgatório”.
Este ensino do purgatório entra em contradição com o
ensinamento de Jesus na parábola do Rico e Lázaro e com a certeza de Paulo de
que partir é “Estar com Cristo”. Aliás, a doutrina do purgatório não é ensinada
em nenhum livro bíblico. Ela encontra algum fundamento no livro de II Macabeus
(12.44-45), que ensina que se deve orar pelos mortos. E os dois livros de
Macabeus, que constam no Antigo Testamento católico, fazem parte dos livros que
Jerônimo (o tradutor da Vulgata Latina — a versão da Bíblia em Latim aprovada
pela Igreja Católica-Romana) chamava de apócrifos, e que constavam
em algumas coleções de livros do Antigo Testamento traduzidos do hebraico para
o grego, mas não constam na Bíblia Judaica (o Antigo Testamento original) em
hebraico. Os judeus nunca reconheceram este livro como Escritura (escrito
inspirado por Deus). Os chamados “pais da igreja” (líderes da igreja dos
séculos II ao IV) se dividiam quanto à inspiração divina dos livros que
contavam na versão grega do Antigo Testamento e não constavam no Antigo
Testamento original (hebraico). Os dois maiores eruditos em Bíblia dentre os
“pais da igreja” — Jerônimo e Orígenes — eram claramente contrários ao
“acréscimo grego” do Antigo Testamento. O bispo católico mais influente no
Concílio de Niceia — Atanásio — relacionou os livros canônicos do Antigo
Testamento (em 367) e não incluiu nenhum dos livros considerados apócrifos por
Jerônimo e que constam hoje no Antigo Testamento católico. A polêmica aumentou
quando Lutero (no século XVI) decidiu pelo cânon hebraico e fez uma tradução da
Bíblia para a língua alemã que trazia os apócrifos do Antigo Testamento numa
parte separada dos demais livros, e explicava que aqueles livros, embora
tivessem valor histórico, não tinham autoridade de escritura sagrada. No
entanto, tais livros foram incorporados ao Velho Testamento da Igreja Católica
Romana no Concílio de Trento (1546), ocorrido alguns anos depois da Reforma
Religiosa (1517), com o principal intuito de combatê-la. Já estudamos e sabemos
porque esses livros chamados hoje de “apócrifos” pelos evangélicos e de
“deuterocanônicos” pelos católicos não fazem parte da revelação de Deus e não
podem servir para estabelecer nenhuma doutrina cristã (ver o post “O Canon Bíblico“).
Se não existe o “sono da alma”, para onde vai
imediatamente a alma de um incrédulo, depois que morre?
A Bíblia nunca nos incentiva a pensar que haverá segunda
chance de aceitar a Cristo depois da morte. Na verdade, o quadro é exatamente o
oposto. A parábola do rico e de Lázaro nos ensina que o rico foi imediatamente
para o Hades (Sheol em Hebraico), para o lugar de
tormentos, e não dá esperanças de que seja possível passar de lá para o paraíso
depois da morte, apesar de ter o rico clamado no Hades: “Pai Abraão, tem
misericórdia de mim! E manda a Lázaro que molhe em água a ponta do dedo e me
refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama”. Abraão, entretanto,
respondeu: “Há um grande abismo entre nós e vós, de forma que os que desejam
passar do nosso lado para o seu, ou do seu lado para o nosso, não conseguem.”
(Lc. 16.26b NVI). Lamentavelmente, a alma dos descrentes vai imediatamente para
o lugar de tormentos e lá aguardará até o juízo final, quando será lançada no
fogo eterno (inferno). Não há segunda chance. A chance de receber o Senhor
Jesus é aqui na terra. E você, já recebeu Jesus como seu único Senhor e
Salvador?
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Questões para reflexão e aprofundamento
- Uma
vez que sabemos que a alma não fica em uma espécie de “sono”, mas que
iremos (os que já recebemos o Senhor Jesus) imediatamente para junto dele
no céu, qual deve ser a nossa atitude para com a nossa própria morte?
- Se o
cristão sabe que a alma do crente vai imediatamente gozar da presença do
Senhor espiritualmente, depois de sua morte, por que se entristece quando
um crente morre?
- De
acordo com o ensinamento da parábola do rico e de Lázaro (Lucas 16.19-31),
bem como o de Hebreus 9.27 e Filipenses 1.22-23, existe uma segunda
chance para uma pessoa ser salva depois da morte?
- Se
uma pessoa pudesse pagar pelos seus próprios pecados num “purgatório” ou
mesmo por sofrer nesta vida, a morte de Jesus Cristo teria sido ineficaz,
pois ele morreu para salvar a todo aquele que nele crê (João 3.16; 5.24).
Você concorda com isto? Comente.
[1] O
Paraíso ou “Seio de Abraão” (Lucas 16:19; 23.43) é um lugar intermediário de
felicidade, onde as almas dos salvos aguardam conscientes (Lucas 16:26) até o
dia da ressurreição, quando, então, os seus corpos ressuscitarão para reinar
com o Senhor na Terra. A palavra Grega Hades no Novo
Testamento tem conotação semelhante à palavra Hebraica Sheol usada
no Antigo Testamento, e significam o mundo dos mortos — um estado intermediário,
que possui dois lados; um, de tormentos, para onde vão os ímpios; o outro — o
“Seio de Abraão”, ou o Paraíso, para onde vão os salvos, assim que morrem.
Esses dois estados ou lugares (o Paraíso e o Lugar de Tormentos) são separados
entre si por um abismo intransponível. Os filhos de Deus (crentes em Jesus
Cristo), quando morrem, vão diretamente para o Paraíso “Estar com Cristo”
(Filip. 1.23; 2 Cor. 5.8, Lc. 23.43). Os os não-salvos, assim que morrem, vão
para o Lugar de Tormentos, para lá aguardarem o Grande
Trono Branco(juízo final), que acontecerá depois do Reino de Mil Anos de
Jesus na Terra (Milênio), quando, então, irão de lá para o inferno (lago de
fogo), juntamente com Satanás e seus anjos (Apoc. 20.5; 20;11-15). Quando
Cristo morreu, e enquanto não havia ressuscitado, Pedro afirma em Atos 2.27 que
ele foi ao Hades — ao mundo dos mortos. O texto de Atos dá a
entender que Hades ali significa morte ou sepultura, pois
Pedro cita o Salmo 16: “Pois não deixarás a minha alma no Hades
(ou Sheol), nem permitirás que o teu santo veja a corrupção.” O que Pedro
afirma, em Atos, é que o corpo de Jesus não ficou morto, mas ressuscitou. Em
Atos 2.27, portanto, Pedro não afirma que Jesus foi ao inferno. Ele
simplesmente diz que o corpo de Jesus esteve na sepultura, morto. Já a passagem
de 1 Pe. 3.18-20 é mais difícil de interpretar. O texto parece afirmar que
Jesus, antes de ressuscitar, foi ao Lugar de Tormentos do Hades, e proclamou
(gr. ekéruksen) aos “espíritos em prisão”. Não é possível hoje
sabermos ao certo o que Pedro queria dizer na passagem. Pode significar que
Jesus foi ao lugar de tormentos no Hades declarar a sua vitória às pessoas que
haviam morrido durante o dilúvio, nos dias de Noé. O teor dessa proclamação de
Cristo aos “espíritos em prisão” também não nos é claro, porém, considerando os
ensinamentos do próprio Jesus, de Paulo, e dos demais apóstolos sobre a
salvação, esta proclamação de Jesus não pode ter sido uma “segunda chance” de
salvação, pois está escrito claramente que isto não existe (Hb. 27.9).
Fonte: http://www.doutrinasessenciais.com/