O abandono do
ateísmo é mais raro do que o abandono à fé. O mundo atual, secularizado, com
influências midiáticas desse pensamento em várias frentes, torna o exercício de
crença mais difícil. Portanto, em casos de pensadores que abandonam a descrença
para reconhecer a existência de Deus, as reações nunca são tímidas.
O filósofo brasileiro Luiz Felipe Pondé, 57 anos, é um dos formadores de
opinião mais lidos do país, e um dos que mais atraem críticas para si, por
causa de suas análises contrárias ao pensamento de esquerda, que atualmente
encontra grande audiência na sociedade.
Numa entrevista à revista Veja, Pondé contou que deixou de ser ateu por
descobrir, na mensagem cristã, uma possibilidade intelectual muito forte para a
existência de Deus, e criticou os ativistas ateus por viverem alienados a
respeito das experiências possíveis a partir da fé.
“Já fui ateu por muito tempo. Quando digo que acredito em Deus, é porque
acho essa uma das hipóteses mais elegantes em relação, por exemplo, à origem do
universo. Não é que eu rejeite o acaso ou a violência implícitos no darwinismo
– pelo contrário. Mas considero que o conceito de Deus na tradição ocidental é,
em termos filosóficos, muito sofisticado. Lembro-me sempre de algo que o
escritor inglês Chesterton dizia: não há problema em não acreditar em Deus; o
problema é que quem deixa de acreditar em Deus começa a acreditar em qualquer
outra bobagem, seja na história, na ciência ou sem si mesmo, que é a coisa mais
brega de todas. Só alguém muito alienado pode acreditar em si mesmo”, afirma
Pondé.
Ainda sobre a descrença, o filósofo pontua que o contraponto, a fé,
permite ver bondade no mundo fadado ao fracasso por conta do pecado: “Comecei a
achar o ateísmo aborrecido, do ponto de vista filosófico. A hipótese de Deus
bíblico, na qual estamos ligados a um enredo e um drama morais muito maiores do
que o átomo, me atraiu. Sou basicamente pessimista, cético, descrente, quase na
fronteira da melancolia. Mas tenho sorte sem merecê-la. Percebo uma certa
beleza, uma certa misericórdia no mundo, que não consigo deduzir a partir dos
seres humanos, tampouco de mim mesmo. Tenho a clara sensação de que às vezes
acontecem milagres. Só encontro isso na tradição teológica”, admite.
Essa entrevista de Pondé à Veja,
concedida em 2011, tem tido sua repercussão diminuída justamente por atacar
bases argumentativas de duas correntes sociais muito presentes na mídia: o
ateísmo e a esquerda. Nela, o filósofo aponta que o pensamento de esquerda, que
orienta propostas de partidos como o PT e o PSOL, por exemplo, atribuem as
mazelas a outros, ignorando a própria contribuição para a realidade injusta.
“O cristianismo, que é uma religião hegemônica no Ocidente, fala do
pecador, de sua busca e de seu conflito interior. É uma espiritualidade
riquíssima, pouco conhecida por causa do estrago feito pelo secularismo
extremado. Ao lado de sua vocação repressora institucional, o cristianismo
reconhece que o homem é fraco, é frágil. As redenções políticas não têm isso.
Esse é um aspecto do pensamento de esquerda que eu acho brega. Essa visão do
homem sem responsabilidade moral. O mal está sempre na classe social, na
relação econômica, na opressão do poder. Na visão medieval, é a graça de Deus
que redime o mundo. É um conceito complexo e fugidio. Não se sabe se alguém é
capaz de ganhar a graça por seus próprios méritos, ou se é Deus na sua
perfeição que concede a graça. Em qualquer hipótese, a graça não depende de um
movimento positivo de um grupo. Na redenção política, é sempre o coletivo, o
grupo, que assume o papel de redentor. O grupo, como a história do século 20
nos mostrou, é sempre opressivo”, comenta Pondé, propondo uma reflexão sobre o
discurso político de esquerda, num contraponto com a mensagem do Evangelho.
Em outro trecho, o filósofo aponta que o conceito neotestamentário é
superior à ideologia de esquerda por determinar que “ninguém, em nenhuma
teologia da tradição cristã – nem da judaica ou islâmica –, pode dizer-se
santo”, e que esse parâmetro é coerente com conceitos de outros pensadores
igualmente milenares: “Isso na verdade vem desde Aristóteles: ninguém pode
enunciar a própria virtude. A virtude de um homem é anunciada pelos outros
homens. Na tradição católica – o protestantismo não tem santos –, o santo é
sempre alguém que, o tempo todo, reconhece o mal em si mesmo. O clero da
esquerda, ao contrário, é movido por um sentimento de pureza. Considera sempre
o outro como o porco capitalista, o burguês. Ele próprio não. Ele está salvo,
porque recicla lixo, porque vota no PT, ou em algum partido que se acha mais
puro ainda, como o PSOL, até porque o PT já está meio melado. Não há
contradição interior na moral esquerdista. As pessoas se autointitulam santas e
ficam indignadas com o mal do outro”.
A respeito da aclamada “revolução sexual”, em que gêneros são um detalhe
e o conceito de que um homossexual é sempre um oprimido, Pondé destaca que a
propaganda dos ativistas nivela as pessoas por baixo, definindo sua importância
a partir do sexo: “Eu considero a revolução sexual um dos maiores engodos da
história recente. Criou uma dimensão de indústria, no sentido da quantidade,
das relações sexuais – mas na maioria elas são muito ruins, porque as pessoas
são complicadas”, conclui. Fonte:http://noticias.gospelmais.com.br/jornada-ateu-encontrou-fe-evangelho-81267.html